O Dr. Marco Aurélio é o responsável pelo setor de Videohisteroscopia do CEPEM e chefe do ambulatório do Hospital Pedro Ernesto.
– Na sua opinião, por que a endometriose é uma doença de difícil diagnóstico no Brasil?
O diagnóstico é difícil no mundo todo, não só no Brasil. Muitos médicos ainda não valorizam a queixa de dismenorreia e não pensam na doença para continuar a investigação. Cerca de 90% das mulheres com endometriose tem esse sintoma – sendo as principais características a forte intensidade e o caráter progressivo. A endometriose profunda também não tem diagnóstico tão fácil na ultrassonografia feita de rotina, sem preparo específico para investigar endometriose (necessita de preparo intestinal para melhor identificação, especialmente nas formas intestinais). Para diagnóstico e mapeamento mais completo da endometriose, sugerimos a ressonância magnética da pelve (também melhor com preparo intestinal). O Ca-125, marcador sérico, pode ser útil quando positivo (acima de 35 UI/ml) no período menstrual. Quando negativo, não exclui a presença da doença.
– Como está o cenário hoje, em termos numéricos, da endometriose no país? Percentual de mulheres acometidas pela doença, faixa etária que mais acontece, acesso ao tratamento…
A endometriose atinge cerca de 15% das mulheres na idade reprodutiva. Temos cerca de 100 milhões mulheres no Brasil e, aproximadamente, 40 milhões estão no período reprodutivo, ou seja, aproximadamente 6 milhões de brasileiras são portadoras de endometriose. O acesso público ao tratamento é limitado, pois exige equipe multidisciplinar e são poucos serviços que oferecem esse cuidado diferenciado. Até mesmo em nível privado não existem muitas equipes especializadas no tratamento da endometriose.
– E no mundo, como a doença é vista? Estamos equiparados ou no exterior existe uma atenção maior ao assunto?
Não diferente do que no Brasil. Na verdade, o Brasil é considerado como um dos países mais desenvolvidos no diagnóstico e tratamento da endometriose. Vários médicos vêm para o Brasil (especialmente São Paulo e Rio de Janeiro) para se aprofundarem nos métodos diagnósticos e de tratamento.
– Quais são os principais exames que podem auxiliar o médico no diagnóstico final da endometriose? Estamos com equipamentos realmente avançados para descobrir a doença?
Os principais métodos são os de imagem – ultrassonografia especializada com preparo intestinal e ressonância especializada também com preparo intestinal. O Brasil tem equipamentos de ponta e profissionais altamente especializados.
– Quais são as principais novidades, em termos de novas descobertas/pesquisas/exames, para o tratamento/diagnóstico da endometriose?
No tratamento da endometriose prevalece a ressecção cirúrgica completa dos focos. Deve ser feita apenas uma boa cirurgia (e não várias cirurgias, que costumam deixar lesões residuais). Hoje em dia, temos a cirurgia robótica, que possibilita cirurgia minimamente invasiva com visão 3D e movimentos extremamente precisos e delicados – menor trauma aos tecidos. Já estamos fazendo de rotina aqui no Rio de Janeiro.
– A endometriose é uma doença que costuma ser associada à infertilidade. Isso é mito ou verdade?
É uma verdade. Cerca de 30 a 50% das mulheres inférteis tem endometriose.
– E, sendo verdade, como deve ser a abordagem médica no que se refere não só ao tratamento como o ao fato de lidar com as questões emocionais femininas?
Esse é um assunto extremamente delicado e impactante para a mulher. Deve ser amparada psicologicamente, pois o tratamento é, muitas vezes, desgastante e nem sempre com resultado positivo. Podem ser feitas as técnicas de reprodução assistida ou a cirurgia minimamente invasiva (laparoscopia ou robótica).
– Comentários finais. Gostaria de registrar mais alguma informação importante e de alerta aos médicos sobre a doença?
Importante desconfiar de endometriose em todas as mulheres com dismenorreia forte e progressiva – praticamente somente a endometriose tem essa característica. Ao desconfiar, devem solicitar exames de imagem especializados e o Ca-125 sérico no 2o dia da menstruação (antes de começar o uso de pílulas contínuas para diminuir as cólicas). Lembrar que cerca de 50% das mulheres com infertilidade (mesmo sem dor) tem endometriose – muitas vezes extensa (com comprometimento intestinal e/ou urinário) – é de bom tom solicitar exames de imagem especializados antes de iniciar tratamento de infertilidade para excluir casos graves de endometriose profunda.